Definição
A esteatose hepática (EH) é
definida como um acúmulo de lipídios no citoplasma de hepatócitos, sobretudo de
triglicérides, excedendo 5% do peso do fígado .Quando o acúmulo de gordura no
fígado ultrapassa 10% e sua distribuição é uniforme pelo órgão, a
ultrassonografia abdominal apresenta elevada acurácia, atingindo de 80% a 95%
de acerto diagnóstico. Quanto maior e mais prolongado for o acúmulo de gordura
no fígado, maiores são os riscos de lesão hepática. Quando há gordura em
excesso e por muito tempo, as células do fígado podem sofrer danos, ficando
inflamadas. Este quadro é chamado de esteato-hepatite ou hepatite gordurosa. A esteato-hepatite é um quadro bem mais
preocupante que a esteatose, já que cerca de 20% dos pacientes evoluem para
cirrose hepática.
Causas
Há algumas décadas acreditava que
o acúmulo de gordura no fígado era causado apenas pelo consumo exagerado de
bebidas alcoólicas, e que a presença da esteatose hepática era necessariamente
algo danoso à saúde. Atualmente sabe-se que a esteatose hepática é muito comum
e pode ser causada por diversas outras condições que não a ingestão crônica de
álcool. Uma esteatose hepática leve (esteatose hepática grau 1 ou 2)
normalmente não causa sintomas ou complicações. O acúmulo de gordura no fígado
é pequeno e não leva à inflamação do mesmo. Não se sabe exatamente por que
alguns indivíduos desenvolvem esteatose hepática, mas algumas doenças estão
claramente ligadas a este fato. Podemos citar:
·
Obesidade:Mais de 70% dos pacientes com
esteatose hepática são obesos. Quanto maior o sobrepeso, maior o risco.
·
Diabetes Mellitus: Assim como a obesidade, o diabetes tipo 2 e a
resistência à insulina também estão intimamente relacionados ao acúmulo de
gordura no fígado.
·
Colesterol elevado : Principalmente níveis altos
de triglicerídeos.
·
Drogas. Várias medicações podem favorecer a
esteatose, entre as mais conhecidas estão: corticoides, estrogênio, amiodarona,
antirretrovirais, Diltiazen e Tamoxifeno. O contato com alguns tipos de
pesticidas também está relacionado ao desenvolvimento de esteatose hepática.
·
Desnutrição ou rápida perda de grande quantidade
de peso.
·
Cirurgias abdominais, principalmente “bypass
gástrico”, retirada de partes do intestino e até cirurgia para remoção da
vesícula.
·
Gravidez.
Não é preciso ter alguma das
condições citadas acima para ter esteatose hepática. Pessoas magras, saudáveis
e com baixa ingestão de álcool também podem tê-la, apesar deste fato ser menos
comum. A esteatose hepática é mais comum no sexo feminino, provavelmente por
ação do estrogênio.
Fisiopatologia da doença hepática alcoólica
O etanol e os efeitos tóxicos do
seu metabolismo originam várias alterações na função normal do fígado. Desta
forma, cabe ressaltar que a formação de acetaldeído e acetato, tanto pela via
da enzima álcool desidrogenase assim como pela via do citocromo P450 2E1, causa
disfunções mitocondriais .Estudos prévios postulam que o consumo de álcool crônico
e excessivo altera a relação NADH/NAD, aumentando a proporção de dinucleótido
de nicotinamida e adenina na forma reduzida/dinucleótido de nicotinamida e
adenina na forma oxidada nos hepatócitos, alterando, em consequência, a β-
oxidação mitocondrial dos ácidos gordos e resultando na acumulação dos mesmos
nos hepatócitos, o que leva ao desenvolvimento da esteatose. Neste contexto, em
condições normais os lípidos são transportados para o fígado na forma de ácidos
gordos livres, cuja maioria penetra o hepatócito e é esterificada em triglicerídeos,
ou oxidada produzindo energia sob forma de ATP e corpos cetônicos, existindo
assim um ciclo constante de ácidos gordos entre o fígado e o tecido adiposo, que
está sob um delicado equilíbrio. No entanto, como já referido, o álcool altera
as funções mitocondriais, aumentando a síntese e absorção dos ácidos gordos e
diminuindo a sua oxidação. Consequentemente, a não-utilização destes ácidos
gordos resulta na acumulação excessiva de lípidos no interior dos hepatócitos e
o desenvolvimento de esteatose hepática. No que diz respeito às manifestações
clínicas da esteatose, observa-se uma estreita relação com o grau da
infiltração de gordura, à causa subjacente e ao tempo de exposição. De um modo
geral, os indivíduos mostram-se geralmente assintomáticos, porém quando a
infiltração da gordura é mais pronunciada pode ocorrer hepatomegalia, cujo
aumento do volume hepático pode atingir até seis vezes o seu volume normal, dor
no hipocôndrio direito e pode ocorrer a evolução para um quadro de
insuficiência hepática.
Embora seja de distribuição
mundial, os diferentes parâmetros histológicos utilizados para seu diagnóstico
e as diferentes populações estudadas dificultam uma exata avaliação da
prevalência do FGNA. De maneira geral, pode-se dizer que em estudos sonográficos
a prevalência de esteatose tem variado de 15% a 25% dos casos em diferentes
partes do mundo1, valores muito semelhantes aos observados em estudo de
necrópsia com prevalência de fígado gorduroso: 24% da população que foi a óbito
em acidentes de trânsito. Em levantamento realizado no Serviço de
Ultra-sonografia do Hospital Sírio-Libanês de São Paulo, avaliando-se o
diagnóstico de mais de 9 mil exames da região abdominal, em 19% deles
observou-se diminuição difusa da ecogenicidade do fígado compatível com aumento
do teor lipídico hepático (Parise ER, Cerri G et al., em preparação). Assim,
poderíamos avaliar a prevalência de esteatose em 20% e de EHNA ( esteatose
hepática não alcólica) em 2% a 3% da população geral. Embora seja doença mais
freqüente na 5a ou 6a década de vida, tem sido encontrada
com relativa freqüência em crianças. É mais comumente observada entre pacientes
com diabete melito tipo 2 (28%55%) e obesos (60%95%) e em pacientes do sexo
feminino (65%83%), apesar de também ser encontrada em pacientes do sexo
masculino, magros e não-diabéticos. A prevalência de hiperlipidemia entre
portadores de FGNA(fígado gorduroso não alcoólico) é muito variáá vel, desde
20% a 92%, sendo mais comum a hipertrigliceridemia, mas o excesso de colesterol
tende a aumentar o conteúdo de gordura no fígado e a elevar as enzimas
hepáticas.
Diagnóstico
O fígado gorduroso
não-alcoólico poderá ser encontrado associado a inúmeras situações médicas,apresentadas
na tabela 2, e que envolvem uma ampla variedade de doenças, toxinas,
medicamentos e procedimentos médicos, como cirurgias abdominais e
emagrecedoras, by-pass
jejunoileal,gastroplastias para tratamento da obesidade, nutrição parenteral
total prolongada, uso de drogas como amiodarona, maleato de perhexilene,
corticosteróides, estrógenos sintéticos, exposição a produtos petroquímicos e
solventes, doenças como hipotiroidismo e lipodistrofia familiar. Tem sido
sugerido10 que o FGNA seria primário quando associado a situações que envolvem
resistência à insulina, como obesidade, diabete melito e hiperlipidemia, e
secundário quando conseqüente aos outros fatores anteriormente citados.
(tabela 2).
Achados clínicos e laboratoriais
A maioria (80%) dos
pacientes com FGNA são assintomáticos e não têm sinais da doença. Em 20% dos
indivíduos, especialmente crianças, pode-se observar desconforto epigástrico ou
em hipocôndrio direito, fadiga ou cansaço e hepatomegalia. Em geral, o
diagnóstico é feito de maneira acidental pelo encontro de elevações nas enzimas
hepáticas ao realizar-se ultrasom de abdome ou pelo encontro de hepatomegalia.
O FGNA apresenta alterações laboratoriais geralmente leves, podendo levar a uma
elevação de duas a cinco vezes dos níveis séricos das aminotransferases (ALT e
AST) e bilirrubinas. Diferentemente da doença alcoólica, a razão AST/ALT é <
1, exceto quando estamos diante de formas avançadas (cirrotização) da doença. A
fosfatase alcalina e a gamaglutamiltransferase (gGT) podem estar elevadas de
duas a três vezes em menos da metade dos casos. Os níveis de bilirrubina e de
albumina séricas estão geralmente dentro dos limites da normalidade. Os valores
séricos dos triglicérides estão maisfreqüentemente elevados que os níveis de
colesterol; a concentração sangüínea do HDL-colesterol está freqüentemente
reduzida e parece existir uma relação inversa entre os valores de
HDL-colesterol e a intensidade da esteatose hepática. Desde que a diferenciação
dos diversos tipos de FGNA só é segura através da biópsia hepática e a maioria
dos pacientes com esse diagnóstico apresenta doença mais benigna, parâmetros
que possam predizer doença avançada têm sido buscados. Angulo et al utilizam
como preditores a idade acima de 45 anos, AST/ALT > 1, presença de obesidade
e diabete. Pacientes com esteatose ao ultra-som e que apresentam todos esses
parâmetros terão 66% de probabilidade de ter fibrose avançada (fibrose septal e
cirrose) à biópsia hepática contra 0% na ausência dos fatores. Mais
recentemente temos proposto a dosagem da laminina sérica e do ácido hialurônico
como preditivos da presença de FGNA com fibrose. Valores elevados de laminina
apresentaram 80% de acurácia diagnóstica em predizer fibrose (em qualquer grau)
ou sua ausência, podendo assim servir como um
screening para indicação de
biópsia hepática nesses pacientes.
Como a doença evolui
A esteatose hepática é comum
nos pacientes com sobrepeso, obesos ou diabéticos. Em parte desses pacientes,
uma inflamação das células hepáticas associada à esteatose pode estar presente,
lembrando a hepatite alcoólica, e que é chamada de esteato-hepatite.
Se não controlada, a
esteato-hepatite não alcoólica tem o potencial de evoluir para a cirrose
hepática em alguns pacientes. É preciso realizar exames para que seja avaliado
o risco de progressão da doença.
TRATAMENTO
Para os casos de FGNA
secundários, o tratamento da causa de base é obrigatório. Assim, o afastamento
do contato com substâncias tóxicas e a suspensão de medicamentos podem
melhorar sensivelmente o quadro. Na Bahia, trabalhadores da indústria
petroquímica afastados da exposição a substâncias voláteis apresentaram
melhora dos níveis das enzimas hepáticas e da histologia hepática. Desde que a
obesidade representa um fator importante no surgimento e na evolução da doença,
a primeira iniciativa tem sido a redução de peso de pacientes obesos. Vários
estudos em adultos e crianças demonstram que a perda de peso através de dieta
hipocalórica isolada ou associada a exercícios físicos reduz os níveis das enzimas
hepáticas e/ou o grau de esteatose e até mesmo de inflamação e da fibrose à
biópsia. A associação com exercícios físicos tem a vantagem de reduzir a
resistência periférica à insulina.A perda de peso corporal desses pacientes
obesos, especialmente com obesidade mórbida, deve ser cuidadosamente
acompanhada. Estudos demonstram que perda rápida e profunda de peso pode levar
a insuficiência hepática, evolução para cirrose e piora da hepatite lobular.
Medicamentos, como metronidazol, ácido ursodesoxicólico, vitamina E,
N-acetilcisteína e betaína e metformina, têm sido utilizados, com diferentes
graus de resposta e de experimentação clínica.O tratamento com agentes
hipolipemiantes como genfibrozila e clofibrato apresentou resultados
contraditórios, mas somente o estudo com a primeira droga teve um grupo
controle. O tratamento com genfibrozila foi seguido de redução dos níveis de
triglicérides e colesterol, com significativa melhora das enzimas hepáticas. A
falta de resposta a agentes hipolipemiantes pode decorrer da hepatotoxicidade
desses medicamentos, que tendem a elevar os níveis das aminotransferases e da
GGT. Especial cuidado deve-se tomar com essa hepatotoxicidade. Muitos
cardiologistas só solicitam controle das enzimas hepáticas após o início do
tratamento e, assim, acabam detectando hepatotoxicidade medicamentosa quando,
na realidade, o paciente já apresentava elevação prévia das aminotransferases
pelo FGNA. Nas formas avançadas com cirrose e insuficiência hepática, o
transplante de fígado está indicado. Entretanto, inúmeros trabalhos têm
demonstrado recidiva de FGNA, no enxerto, que geralmente acompanha o aumento do
índice de massa corpórea dos pacientes no pós-operatório e o uso de
corticosteróides.
Referências:
Dr. Edison Roberto Parise
Professor Adjunto da Disciplina de Gastroenterologia da Universidade Federal de
São Paulo/Escola Paulista de Medicina, Hepatologista do Grupo de Transplante de
Fígado do Hospital Sírio-Libanês
“ESTEATOSE HEPÁTICA RELACIONADA
AO CONSUMO DE BEBIDAS ALCOÓLICAS E OBESIDADE” Elton Pereira Teles Júnior¹;
Talita Buttarello Mucari², Paulo Martins Reis Júnior
Maravilha!!!
ResponderExcluirQual o tratamento adequado para quem tem Esteatose Hepática?
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