O
esôfago de Barrett é uma enfermidade caracterizada pela substituição do
epitélio estratificado pavimentoso do esôfago por epitélio colunar
especializado do tipo intestinal. Tal quadro é recorrente em pacientes com
refluxo gastroesofágico, apresentando longa duração. Ele é proveniente de uma
resposta adaptativa da mucosa à agressão pelo ácido gástrico que reflui. Entre
os fatores de risco para o desenvolvimento do esôfago de barrett estão a hérnia
de hiato, ineficiência do esfíncter inferior do esôfago e o refluxo do conteúdo
duodenogástrico. E este, o EB, representa um risco iminente para o câncer,
sendo que, aproximadamente, 10% dos pacientes portadores desenvolvem
adenocarcinoma no terço inferior do esôfago.
O
esôfago de Barrett pode ser identificado em exame endoscópico pela presença de
mucosa glandular acima da junção esofagogástrica. Sendo classificado como EB
curto quando o epitélio fica nos 3cm distais do esôfago tubular e EB clássico,
quando a mucosa glandular se estende por mais de 3 cm. O quadro da doença
consiste na presença dos seguintes epitélios: o epitélio gástrico fúndico com
células parietais e principais, o epitélio gástrico juncional da cárdia com
glândulas secretoras de muco e o epitélio colunar especializado com metaplasia
intestinal, sendo a presença de epitélio colunar especializado com células
caliciformes, caracterizado morfologicamente como metaplasia intestinal um
consenso atual para o diagnóstico histológico. Há vários tipos de células
colunares que compõem a metaplasia intestinal, dentre elas, as células
gástricas, células típicas do intestino delgado e cólon. O epitélio colunar de
Barrett caracteriza-se pela presença da borda em escova e células caliciformes,
associado à expressão gênica intestinal.
A
proliferação celular no EB apresenta índices aumentados quando correlacionada
com taxa de proliferação de epitélio colunar de sítio não metaplásico, estando
este evento associado a um processo de desregulação do ciclo de divisão celular.
A metaplasia é a substituição de células adultas, características de um
determinado órgão, por outro tipo celular, mais resistente que o anterior. O
refluxo gastroenteroesofágico, ácido ou biliopancreático, sintomático ou não,
causa dano por processo inflamatório crônico, lesando o epitélio intestinal que
acaba por ser reparado, ao longo dos anos. A metaplasia é uma condição
pré-maligna, resultante de alterações genéticas, podendo haver o
desenvolvimento de adenocarcinoma. Nos casos em que o esôfago terminal
apresenta revestimento com epitélio colunar, mas não preenche os critérios para
metaplasia intestinal tipo Barrett, não pode ser mais classificado como EB,
recebendo a denominação de esôfago revestido por epitélio colunar.
O
quadro clínico tem manifestações semelhantes às apresentadas pelos pacientes
com DRGE e síndromes dispépticas. Contudo, em geral, o tempo de queixa
encontra-se ampliado e, quando a duração dos sintomas é superior a 5 anos e há
associação com queixas noturnas de pirose e regurgitação, a prevalência desta
entidade é maior. Salienta-se que pode apresentar-se assintomática, podendo
corresponder apenas a um achado endoscópico. Entretanto pode ser associada a
manifestações extra-esofágicas, tais como as pulmonares e
otorrinolaringológicas.
O
procedimento de escolha para o diagnóstico é a endoscopia digestiva alta,
podendo ser confirmada a metaplasia por meio de biópsia. Recomenda-se que
pacientes com sintomas de DRGE por mais de 5 anos sejam submetidos ao
procedimento, especialmente se tiverem 50 anos ou mais. Pode ser encontrada
displasia, que é apontada como a etapa anterior ao aparecimento de neoplasia em
nível macroscópico. A nível histológico, trata-se de neoplasia intra-epitelial,
com atipias celulares restritas ao epitélio, sem invadir a membrana basal.
A
displasia pode ser classificada em baixo grau, alto grau e indefinido para
displasia, a partir dos atributos propostos por Montgomery: maturação
epitelial, arquitetura das glândulas, características citológicas e presença de
inflamação. Na mucosa normal, as glândulas se apresentam redondas ou ovais e
sem ramificações, encontrando-se em meio a um estroma de tecido conjuntivo
frouxo. É considerada alteração arquitetural o aglomeramento de glândulas,
presença de ramificações e/ou mudanças nos seus tamanhos e formas. Para
analisar a maturação epitelial, compara-se as células das porções profundas da
mucosa com as células da superfície. Considera-se alteração a presença de
núcleos maiores na superfície. Podem ser encontradas ainda atipias citológicas
relacionadas ao volume, cor e relação núcleo/citoplasma, e sinais de
inflamação.
O
tratamento farmacológico para esôfago de Barrett é o mesmo aplicado para DRGE,
com o emprego de inibidores da bomba de prótons. Há pouca evidência, no entanto,
de que este tratamento evite o surgimento de adenocarcinoma ou leve à regressão
do quadro. O paciente deve evitar em sua dieta o consumo de alimentos fritos e
gordurosos, chocolate, menta, álcool, café, bebidas gaseificadas, frutas
cítricas, tomate e derivados, mostarda, vinagre, aspirina e demais
anti-inflamatórios não esteroidais. Tais alimentos aumentam a secreção ácida do
estômago, o que pode agravar o quadro. Como ocorre o refluxo das secreções
pancreática e biliar junto ao suco gástrico, o tratamento farmacológico pode
ser ineficaz, por atuar apenas sobre o componente ácido do refluxo. Nesses
casos, a cirurgia é indicada, tendo maior eficácia na regressão dos fatores
associados a câncer do que o tratamento farmacológico.
A
ocorrência do distúrbio é mais frequente entre os 55 e 65 anos, acometendo duas
vezes mais homens que mulheres, sendo que homens brancos constituem 80% dos
portadores da doença. São fatores de risco o tabagismo, consumo de álcool,
obesidade e uso de bifosfonatos orais (utilizados para o tratamento de
osteoporose). A prevalência varia entre 0.9% e 10% da população adulta. Apenas
0.5% dos pacientes com esôfago de Barrett desenvolve adenocarcinoma no esôfago,
porém esse número vem crescendo.
O nome
do distúrbio foi dado em homenagem ao cirurgião torácico inglês Numan R.
Barrett (1903-1979), que em 1950 descreveu no artigo Úlcera péptica crônica e esofagite uma condição distinta da
esofagite relacionada ao refluxo, mas a atribuiu a uma extensão do estômago
para dentro do mediastino. Allison, outro cirurgião torácico, e Johnstone, um
radiologista, publicaram em 1953 outro artigo, em que descrevem como úlceras de
Barrett as regiões em que foi percebida metaplasia intestinal, e o próprio
Barrett, em 1957, publicou mais um artigo, em que concorda com a conclusão a
que chegaram Allison e Johnstone em 1953.
Referências
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1676-24442004000300009
http://emedicine.medscape.com/article/171002-overview
Muito bom!
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