quarta-feira, 30 de maio de 2018

DOENÇA DE CROHN




DOENÇA DE CROHN


As doenças inflamatórias intestinais são representadas, atualmente, por duas grandes patologias: a doença de Crohn e a retocolite ulcerativa. A doença de Crohn possui caráter multifatorial, transmural, desenvolvimento crônico, caracterizando-se pela inflamação da mucosa do trato intestinal, podendo atingir não somente regiões do intestino delgado e grosso mas também órgãos subjacentes. A doença apresenta-se de forma segmentar, descontínua e inconstante pelo trato intestinal, possuindo esse então áreas saudáveis interpostas por áreas acometidas por grave processo inflamatório. As principais diferenças entre a doença de Crohn e a colite ulcerativa deve-se ao fato que nessa a área de acometimento inflamatório é contínua e restrita a mucosa do tubo intestinal, atingindo principalmente reto e regiões proximais do colo. Ainda assim, a diferenciação entre as duas doenças é um trabalho difícil uma vez que a sintomatologia, que envolve diarreia, dores abdominais, febre, anemia dentre outros é partilhada por ambas.

EPIDEMIOLOGIA

A doença de Crohn é uma doença multifatorial pois sua incidência e prevalência depende de fatores de risco, meio ambiente, hábitos individuais, genética e fatores de agravo. Estudos recentes mostram baixa incidência da doença na população geral, ocorrendo em todo o mundo, porém com maior incidência nos países mais desenvolvidos do ocidente, onde a população consome cada vez menos fibras, fumam muito e utilizam anticoncepcionais orais. Nas últimas décadas, observou-se uma tendência ao aumento do número de casos na América Latina, podendo ser devido ao aperfeiçoamento dos métodos diagnósticos ou devido ao real aumento do número de casos. No Brasil a doença ainda é pouco conhecida e por isso não existem dados suficientes que demonstrem a incidência e prevalência de forma fidedigna.  A doença de Crohn pode acontecer em qualquer idade, acometendo principalmente adultos jovens. Apresenta dois picos de acordo com a faixa estaria: um entre 15-25 anos e o outro entre 50-80 anos, sendo mais predominante em mulheres, principalmente devido a questões hormonais. Estudos realizados no Brasil, apresentaram maior incidência da doença de Crohn entre brancos e pardos do que em negros e amarelos e ainda apresenta maior incidência familiar em irmão e em gêmeos idênticos.

FISIOPATOLOGIA / ALTERAÇÕES HISTOLÓGICAS

A doença de Crohn (DC) é uma doença inflamatória crônica do trato gastrointestinal, que pode envolver qualquer segmento desde a boca até ao ânus. A presença de áreas de mucosa normal intercalando áreas afetadas pela doença, isto é, o envolvimento segmentar, acometendo toda a parede do órgão e com lesões tipicamente granulomatosas do intestino, caracteriza a DC, diferenciando-a da retocolite ulcerativa (RCU), que apresenta envolvimento confinado à mucosa do cólon e reto, de forma contínua.A DC pode ser classificada em cinco subgrupos, de acordo com a localização anatômica das lesões:(1) ileal: envolvimento exclusivo no íleo, mas poderia incluir o envolvimento do trato gastrointestinal alto; (2) colônica: envolvimento limitado ao cólon e raramente ao reto; (3) ileocolônico: envolvimento do íleo e do cólon, mas poderia incluir o envolvimento do trato gastrointestinal alto; (4) doença confinada somente ao trato gastrointestinal alto; como boca, língua, esôfago, estômago e duodeno. (5) envolvimento perianal: é considerada doença perianal os achados clínicos de fístula perianal, abcesso perianal, mas não fissuras ou plicomas (hipertrofia da pele em resposta a um processo inflamatório crônico) perianal. Na visão macroscópica, na doença aguda encontram-se as alças intestinais róseo-acinzentadas ou vermelhas púrpuras escuras, com parede intestinal borrachuda e espessa, como resultado do edema, inflamação, fibrose e hipertrofia da muscular própria. O mesentério do segmento pode ficar espessado ou não. Encontra-se, também, na superfície da alça intestinal, áreas de um exsudato cinzaesbranquiçado espesso ou fibrose da serosa granular. Conforme a doença progride, a parede intestinal torna-se cada vez mais espessada, com luz do lúmen intestinal estreita (estenose) e a membrana mucosa com aspecto emborrachada. O intestino proximal não envolvido pode estar dilatado secundariamente à obstrução do segmento lesado. Os estreitamentos podem ocorrer no cólon, mas em geral são menos intensos. Em muitos casos, o segmento intestinal envolvido se apresenta com hiperemia (aumento da quantidade de sangue circulante num determinado local), com deposição de fibrina, aderência entre as alças intestinais adjacentes ou outras vísceras, inflamação descontínua na mucosa, espessamento submucoso, fibrose e úlceras. Estas últimas inicialmente são pequenas, e tornam-se mais extensas e profundas, muitas vezes sob forma de fissuras que podem causar fístulas ou abscessos. O mesentério do segmento envolvido em geral torna-se espessado, fibrótico, com edema e grande quantidade 31 de gordura, notando-se também linfonodos aumentados. Microscopicamente, um sinal característico da doença em fase inicial são as úlceras aftóides, puntiformes ou lineares mais profundas, edemas e perda de textura da mucosa normal. Os aspectos histológicos mais comuns encontrados na DC são: inflamação de mucosa, ulceração e presença de granulomas não-caseosos (sem caseificação). Esses processos inflamatórios na DC são caracteristicamente transmural, o que contrasta com a RCU. O envolvimento de todas as camadas da parede intestinal pelo processo inflamatório (transmural), que pode estender-se até a gordura mesentérica e linfonodos regionais, é responsável pela instalação de fissuras, fístulas entre alças intestinais, órgãos vizinhos, parede abdominal e região perianal; abscesso, densas aderências entre alças intestinais e áreas de estenose intestinal. Outro aspecto típico encontrado na mucosa intestinal acometido pela doença é o chamado “pedra de calçamento”, que resulta da combinação da ulceração mucosa profunda e espessamento submucoso nodular. O processo inflamatório nas DII possui variação de características morfológicas, microscópicas e macroscópicas.Porém os achados macro e microscópicos em um paciente com DII não são suficientes para determinar o diagnóstico clínico de DC e RCU, devido às manifestações clínicas e morfológicas serem semelhantes nas duas doenças.

Macroscopicamente caracteriza-se por lesões bem delimitadas, separadas umas das outras (lesões salteadas). Inicialmente a parede intestinal é edematosa, hiperemiada, espessada, notando-se pequenas úlceras na mucosa (aftoides).




Microscopicamente podemos observar que as ulcerações são estreitas e profundas, muitas vezes atingindo a serosa. O infiltrado inflamatório, mononuclear, tem distribuição transmural, não sendo restrito portanto às áreas ulceradas. Ocorrem fibrose e edema consideráveis. As glândulas costumam manter a sua população normal de células caliciformes.



Em 60 a 70% dos casos de doença de Crohn, ocorrem granulomas. Estes são constituídos por linfócitos, macrófagos, células epitelióides e células gigantes inflamatórias, distinguindo-se daqueles da tuberculose por não apresentarem necrose caseosa nem bacilos, sendo por isso denominados de granulomas epitelióides.

Os granulomas podem estar presentes em qualquer das camadas da parede intestinal e até mesmo nos linfonodos regionais. Este achado é muito importante quando a doença de Crohn está restrita ao colon, permitindo a sua distinção da colite ulcerativa, coisa nem sempre fácil. É importante lembrar que a doença de Crohn pode ser confundida com a tuberculose intestinal, principalmente em nosso meio, onde a tuberculose é uma doença frequente.

SINTOMATOLOGIA



A doença de Crohn apresenta como sintomas mais recorrentes diarreia, perda de peso, dores abdominais com cólica e febre que pode permanecer por dias a semanas. Além disso, outras manifestações clínicas costumam aparecer como estomatites (inflamações na boca), estenose, principalmente, no intestino delgado e dificuldade na eliminação de gases intestinais. Algumas manifestações extraintestinais podem ocorrer como artralgia, psoríase, uveíte, litíase renal e bronquite. Em alguns casos pode haver a ocorrência de fístulas que podem ser múltiplas e apresentar extensa destruição tecidual. Há situações em que a diarreia pode apresentar muco e as fezes apresentarem sangue, principalmente quando o processo inflamatório está intenso no intestino grosso.

TRATAMENTO

A evolução da doença pode variar de acordo com as manifestações intestinais e extraintestinais. O tratamento para a Doença de Crohn depende da evolução dessa doença, do grau de gravidade desenvolvido, dos principais locais acometidos e do estado geral do paciente. É baseado na manutenção da remissão, controle dos sintomas, terapia nutricional e em alguns casos pode ocorrer intervenção cirúrgica.  Na maioria dos casos, o tratamento inicial para essa doença é feito com a utilização de diversos fármacos como aminossalicilatos, corticosteroides, antibióticos e imunossupressores, por exemplo.  Os aminossalicilatos causam, principalmente, a inibição da síntese de citocinas inflamatórias e da proliferação dos linfócitos T. Os aminossalicilatos mais utilizados são a sulfasalazina, mesalazina, olsalazina e a balsalazina. O uso de corticoides é recomendado quando os aminossalicilatos não estão oferecendo uma resposta efetiva para a intensa resposta inflamatória própria da doença de Crohn. No entanto, são mais eficazes em induzir a remissão da doença e não para a manutenção, uma vez que podem causar, se administrados a longo prazo, hipertensão arterial, diabetes e osteoporose. Os corticóides podem ser administrados por via oral, como o prednizona, via retal como o valerato de betametasona, sendo essa via mais indicada nas formas mais distais da doença, ou por via parenteral como o metilpredinisona, nesse caso o paciente precisa ficar internado. O tratamento cirúrgico é recomendado quando o tratamento farmacológico não está sendo eficiente, o paciente apresenta instabilidade clínica, obstrução intestinal total ou parcial, fístulas entéricas, abcessos e massas inflamatórias e hemorragias. Essa intervenção cirúrgica pode ocasionar uma perda de mais de 100 cm do intestino, levando assim ao desenvolvimento, em muitos casos, da Síndrome do Intestino Curto.  A ressecção de uma porção intestinal tem sido a abordagem mais utilizada dos casos de Doença de Crohn, principalmente no envolvimento da região ileocecal e em alguns casos pode ocorrer retirada parcial do intestino delgado. Além do tratamento com fármacos e da intervenção cirúrgica, é essencial que o paciente realize uma terapia nutricional, uma vez que a desnutrição é uma manifestação recorrente nos casos dessa doença. Assim, o tratamento nutricional que deve ser feito de maneira individual e de acordo com o estado nutricional do paciente. Na maioria dos casos, é recomendado uma dieta contendo ácidos graxos da variedade ômega 3, aminoácidos como glutamina, antioxidantes, probióticos e prébióticos. O conjunto desses tratamentos visam aumentar a sobrevida e garantir uma melhor qualidade de vida ao paciente.


 REFERÊNCIAS


FERRARI, Maria Lourdes de Abreu et al. Aspectos clínicos da doença de Crohn em um centro de referência para doenças intestinais. GED gastroenterol. endosc. dig, v. 23, n. 4, p. 151-164, 2004.
DOENÇA DE CROHN, A. Doença de Crohn.

PAPACOSTA, Nicolas Garcia et al. DOENÇA DE CROHN. Revista de Patologia do Tocantins, v. 4, n. 2, p. 25-35, 2017.

VICTORIA CR, SASSAKI LY, NUNES HRC. Incidence and prevalence rates of inflammatory bowel diseases, in midwestern of São Paulo state, Brazil. São Paulo. Arq Gastroenterol, v. 46, n.1, p. 20-25, 2009.

CHO JH. The NOD-2 Gene in Crohn’s Disease: Implications for Future Research Into the Genetics and Immunology of Cronh’s Disease. USA. Inflammatory Bowel Diseases, v. 7, n. 3, p. 271–275, 2001.

MERKLE CJ. Manual de Fisiopatologia. In___: Sistema Gastrointestinal: Doença de Crohn. São Paulo: Roca, 2007. p. 310-311.

Robbins and Cotran Pathologic Basis of Disease 7th Edition: Vinay Kumar, Abul K. Abbas and Nelson Fausto Eds. Elsevier Inc 2005 International Edition.




segunda-feira, 28 de maio de 2018

ENTEROCOLITE PARASITÁRIA (AMEBÍASE)



INTRODUÇÃO

A amebíase é uma infecção causada pelo protozoário intestinal parasítico Entamoeba histolytica (a "ameba de lise tecidual"). É a segunda doença que causa mais mortes, principalmente entre a população que possui condições mais precárias. Apesar disso, a maioria das infecções é assintomática (espécies não patogênicas/invasivas: E. dispar e E. moshkovskii.), mas E. histolytica pode causar doença que leva desde a disenteria até infecções extra-intestinais, incluindo abcessos do fígado.  
 



E.histolytica existe em dois estágios: uma forma de cisto multinucleado resistente e o estágio de trofozoíto móvel. A infecção é adquirida pela ingestão de cistos contidos em alimentos ou água contaminada com fezes, ou mais raramente, por meio de contato sexual oral-anal. Os cistos sobrevivem na acidez do estômago e o exocisto no intestino delgado formando o estágio de trofozoíto de 20 a 50 micrômetros. Os trofozoítos podem viver no interior da luz do intestino grosso sem causar doença ou podem invadir a mucosa intestinal, provocando colite amebiana. Em alguns casos, os trofozoítos invadem a mucosa e acorrente sanguínea, trafegando pela circulação portal e atingindo o fígado e causando abcessos hepáticos amebianos (Nos países onde a amebíase invasiva tem alta prevalência, o abscesso hepático é mais frequente, constituindo uma grave complicação).



EPIDEMIOLOGIA

As infecções por E. histolytica são mais comuns em áreas do mundo onde o sanitarismo precário e o excesso populacional comprometem as barreiras à contaminação de alimentos e água potável nas fezes humanas. As áreas endêmicas incluem partes do México, Índia e países das regiões tropicais da África, Américas do Sul e Central, e Ásia. 
Uma característica marcante da amebíase é sua ocorrência mais comum em homens do que em mulheres, embora a prevalência da infecção com E. histolytica não pareça diferir entre os sexos. Esse padrão é particularmente pronunciado para abcessos hepáticos amebianos, cuja prevalência é aproximadamente 7 vezes maior entre os homens do que entre as mulheres.

PATOGENIA E VIRULÊNCIA

A doença se inicia quando os trofozoítos do E. histolytica aderem às células epiteliais da mucosa, possuindo trofismo maior por células da região do ceco e retosigmoidais. A alta adesão entre célula-protozoário é devido a presença de lectinas e estruturas filopódicas que aumentam a adesão e promovem a fixação ás células do hospedeiro. Os trofozoítos possuem muitas estruturas que podem ser utilizados para aumento de sua patogenicidade, entre elas destacam-se adesinas, e uma alta gama de proteinases que promovem a lise de células e tecidos, induzindo a apoptose e levando a necrose tecidual das regiões em que coloniza. Quando a barreira epitelial é rompida, ocorre a invasão à mucosa, os trofozoítos reproduzem e entram nos tecidos adjacentes com diminuta reação inflamatória.


 Na mucosa e submucosa, as amebas podem progredir em todas as direções, determinando inicialmente a típica ulceração chamada “botão de camisa”. Mas ocasionalmente podem atingir o tecido conjuntivo e induzir a uma resposta inflamatória proliferativa com formação de uma massa granulomatosa, chamada “ameboma”, que é um tumor benigno do ceco ou do retossigmoide que diminui a luz do espaço intestinal.




Outra possibilidade é a penetração no sangue, no qual podem se transportar através  da mesentérica superior, para o fígado e causar inflamações agudas e abscessos (SANTOS et al., 2011).Nesses casos, os sintomas aparecem em média três meses após os sintomas intestinais.  Podem também atingir o pulmão, mais raramente o cérebro e, em certas circunstâncias, a pele e as regiões anal ou vaginal (NEVES, 2016).


O período de incubação depende da quantidade de patógeno ingerida e das condições próprias do hospedeiro, a exemplo da idade, resposta do sistema imunológico, e outras patologias associadas e pode ser, em média, de uma semana a 4 meses. A taxa de mortalidade pode ser muito alta se não for medicada.
Existem duas principais formas clínicas: amebíase intestinal e amebíase extra intestinal. Podendo evoluir sem sintomatologia ou apresentar sintomas típicos tais como: disenteria, febre que pode ser moderada ou não acontecer, leucocitose menor que 10 mil glóbulos brancos por microlitro e evacuações frequentes (10 vezes ao dia) (CHAVES et al.,2010). Uma das apresentações que também é comuns é a colite não disentérica com a presença de duas a quatro evacuações pastosas ou com muco e sangue, alternando com uma constipação, tenesmo e flatulência.
Na apresentação extra-abdominal o paciente cursa com dor referida ao hipocôndrio direito, que aumenta ao menor movimento, sendo a intensidade da dor variável, muito semelhante a uma cólica biliar. A febre apresenta-se frequentemente no período noturno e pode chegar aos 40°C associada com astenia, calafrios, suores, náuseas e vômitos. Na forma subaguda da amebíase a perda de peso é o principal sintoma.

DIAGNÓSTICO

Uma das formas de diagnóstico é a presença de trofozoíto nas fezes. Quando o diagnóstico é feito dessa maneira não ocorre diferenciação da E. histolytica, E. dispar e E. moshkovskii. Porém existem outras formas de diagnóstico através da utilização de anticorpos séricos, ultra sonografia, tomografia axial computadorizada para diagnóstico dos abcessos amebianos. Quando se usa técnicas mais específicas, que detectam antígenos ou DNA específico, a prevalência consequentemente cai consideravelmente, já que a maioria das pessoas (indivíduos assintomáticos) está infectada por outra ameba que não a E. histolytica (CHAVES et al.,2010).
 No exame físico tem sinais de desidratação e dor abdominal na fossa ilíaca direita com aumento de ruídos no trato gastrointestinal. Na fase extra-abdominal apresenta hepatomegalia dolorosa, que acaba dificultando a palpação. Pelo comprometimento do fígado, pode ocorrer icterícia. (SILVA et al, 2005).
Durante as manifestações clínicas ocorre grande perda de água e eletrólitos, por isso manter a hidratação durante o tratamento é muito importante. Outro fator importante no tratamento é a identificação dos casos que são a presença de E. histolytica patogênica, que é a única que se recomenda tratamento. Os fármacos de escolha nesses casos são o Metronidazol, que está presente no quadro de medicamento do SUS e Secnidazol, que possui como vantagem ser dado em dose única para adultos e crianças.

TRATAMENTO

A OMS estabeleceu que o tratamento da amebíase deverá ser iniciado apenas em casos de confirmação específica de E. histolytica. A diferenciação do tipo patogênico da dispar é indispensável para o tratamento com drogas específicas e acompanhamento adequado. O fármaco de escolha no Brasil é o metronidazol, medicamento de baixo custo oferecido pelo SUS, mas pode-se utilizar o secnidazol em dose única para adultos e crianças. Este último é de ação rápida e absorção completa e tendo meia-vida mais longa que os principais s derivados imidazólicos.
Segundo NEVES (2016) podemos classificar os medicamentos contra a amebíase 3 grupos distintos: Amebicidas, que atuam diretamente na luz intestinal, Amebicidas tissulares e Amebicidas que atuam na luz intestinal e nos tecidos. O primeiro grupo, que atua na luz intestinal, tem uma ação direta por contato sobre a E. histolytica fixada na parede ou na luz do intestino. São eles os derivados de quinoleína: iiodohidroxiquinoleina, iodocloro-hidroxiquinoleina, cloridroxiquinoleína; antibioticos: as paramocininas e eritromicina; e por fim, outros derivados: furoato de diloxamina, clorobetarnida e clorofenoxarnida. As de ação tissular, intestino e fígado, são compostos de cloridrato de emetina, cloridrato de diidroemetina e cloroquina. Por fim, os que atuam na luz intestinal e tecidos: antibióticos isolados ou combinados com outros amebicidas: tetraciclinas e seus derivados, clorotetraciclina e oxitetraciclinas; eritromicina; espirarnicina e pararnomicina. Derivados imidazólicos: metronidazol ornidazol, nitroimidazol e seus derivados, secnidazol e tinidazol. São utilizados por via oral como injetáveis..No caso de portadores assintomáticos ou de colites não disentéricas, são indicados os medicamentos de ação direta na luz intestinal, como o teclosan e etofamida,e normalmente repte-se o tratamento. Na amebíase extra-intestinal, principalmente no abscesso hepático, o metronidazol é a droga mais indicada, na dosagem de 500 a 800mg três vezes ao dia durante cinco a dez dias. Deve-se considerar que o tratamento medicamentoso geralmente está associado a efeitos adversos que variam desde náuseas e dor abdominal até diarréias e vômitos.

Tabela: Tratamento da amebíase

PROFILAXIA

A E. Histolytica pode ser transmitida através de alimentos e água que contenham o patógeno e, também por isso, países em desenvolvimento e que apresentam problemas consideráveis com saneamento básico apresentam números elevados de casos, justamente devido às condições sanitárias e deficiências no saneamento. Esse quadro aponta para a necessidade das medidas profiláticas estarem principalmente voltadas para a melhoria dessas condições, seja através do tratamento de esgoto, tratamento adequado da água, educação da população sobre como utilizar a água, fervendo, por exemplo, higienizar os alimentos, lavagem das mãos e outras medidas de baixo custo. É importante salientar que a OMS sugere ainda, com o objetivo de evitar a ingestão de cistos viáveis, lavar bem e ferver todos os alimentos crus. No caso das verduras, elas devem ser mergulhadas por 15 minutos numa solução de 0,3g de permanganato de potássio para 10 litros de água ou três gotas de iodo por litro de água, eliminando os cistos viáveis. Depois desse procedimento, lavar em água corrente.



REFERÊNCIAS

ANDRADE, Elisabeth et al. Parasitoses intestinais: uma revisão sobre seus aspectos sociais, epidemiológicos, clínicos e terapêuticos. Rev. APS, Juiz de Fora, v. 13, n. 2, p. 231-240, abr./jun. 2010.

CORDEIRO, Thiago; MACEDO, Heloisa. AMEBÍASE. Revista de Patologia Tropical, Goiás, Vol. 36, p.119-128, maio-ago. 2007.

LONGO, Dan L.; FAUCI, Anthony S. Gastrenterologia e Hepatologia de Harrison. 2°. ed. Porto Alegre: AMGH, 2014. 600 p. v. I. Disponível em: <https://books.google.com.br/books?hl=pt R&lr=&id=FxyGBAAAQBAJ&oi=fnd&pg=
PA239&dq=ameb%C3%ADase+intestinal&ots=oWSQYnm7yh&sig=juTOEmKcmQjKKWw1z376CH8n8pU#v=onepage&q&f=true>.

NEVES, David Pereira. Parasitologia humana.13. ed. São Paulo: Atheneu, 2016. PALERMO CHAVES, Antônio Carlos; SEIXAS FILHO, José Teixeira de; LIMA DANTAS, Marcia Macedo. Revisão do mecanismo fisiopatológico da amebíase. Revista Augustus, Rio de Janeiro, v.14, n.29, p.74-87,2010. Available from .

NICOLI, Bruna Moreira et al. AMEBÍASE: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA E VISÃO EPIDEMIOLÓGICA. 2017.Disponível em <http://www.pensaracademico.facig.edu.br/index.php/semiariocientifico/article/view/412/343>




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quarta-feira, 23 de maio de 2018

[CC II: #9] ADENOCARCINOMA DE PÂNCREAS


ANATOMIA DO PÂNCREAS:


O sistema digestório tem algumas glândulas anexas que auxiliam no seu papel de digestão e consequente absorção de nutrientes, uma delas é o pâncreas - que é responsável pela secreção de substancias endócrinas, como glucagon e insulina, que regulam o nível de glicose no sangue e exócrinas, como o suco pancreático repleto de enzimas digestivas. Essa víscera é retroperitonial, ou seja, não está envolta pela camada de peritônio, encontrando-se fixada na parede posterior do abdome. Anatomicamente, o pâncreas está atrás do estômago, lateral ao duodeno à direita e à esquerda está o baço, na altura das vertebras LI e LII. É dividido em quatro partes: cabeça, colo, corpo e cauda. O suco pancreático é drenado para o duodeno por meio de dois ductos, o principal e o acessório. O principal abre-se numa estrutura chamada papila maior do duodeno, onde há a formação da ampola hepatopancreática, que é a junção do ducto principal do pâncreas com o ducto colédoco, proveniente da vesícula biliar. A irrigação pancreática é dada, principalmente, por ramos da artéria esplênica, contudo, há participação de diversas outras artérias como as gastroduodenais e mesentérica superior, que darão origem às artérias pancreaticoduodenais. Devido à vasta irrigação, qualquer procedimento cirúrgico nessa área é dificultado, pois há ligação direta com outros órgãos, a exemplo do baço.  A drenagem venosa é feita pelas veias pancreáticas, que drenam, em sua maioria, para a veia esplênica. Apesar de possuir uma sensibilidade escassa para dor, o pâncreas é inervado pelos plexos celíaco e mesentérico superior, derivados dos nervos vago e esplâncnico abdominopélvico (MOORE, 2014). 

CONCEITO DA DOENÇA

O adenocarcinoma de pâncreas é um câncer com uma alta taxa de letalidade, devido à descoberta tardia da doença, relacionada principalmente com a falta de sintomas ou dores. Então, quando a pessoa nota alguma diferença, o tumor está avançado - o que dificulta o tratamento quimioterápico e cirúrgico. O câncer de pâncreas é mais comum na região dos ácinos, que são as células responsáveis pela produção do suco pancreático, abrangendo cerca de 93% dos casos, sendo esses classificados como adenocarcinoma, enquanto o câncer na ilhota de Langerhans, células encarregadas da produção de hormônios como a insulina, são mais raros tendo uma relevância em 7% dos casos. O câncer é a perda da capacidade de controlar o crescimento celular, dessa forma, as células pertencentes aquele tecido passam a multiplicar-se rapidamente sem nenhum controle, resultando em tumorações que irão prejudicar a funcionalidade do órgão e poderá afetar outros tecidos (GOLDMAN, et al. 2009; LONGO, et al, 2013) .

 EPIDEMIOLOGIA

O câncer de pâncreas é a quarta causa mais comum de morte por câncer nos Estados Unidos, apesar de sua baixa incidência: aproximadamente 42.500 neoplasias pancreáticas são diagnosticadas e 35.200 indivíduos morrerão todos os anos de causas relacionadas com o câncer. No mundo todo, o câncer de pâncreas corresponde a 2% de todas as neoplasias. 

HISTOFISIOLOGIA

Os carcinomas são mais comuns na cabeça e no corpo, representando respectivamente 70% e 20% do total, do que na cauda (10%) do pâncreas. Quase todos os carcinomas pancreáticos tem origem nas células ductais e sua minoria se origina nas células acinares.  “A neoplasia intraepitelial pancreática e os tumores mucinosos papilares intraductais parecem ser lesões precursoras do adenocarcinoma ducta do pâncreas. Os resultados das análises moleculares sugeriram que a origem celular seja monoclonal em pelo menos 95% dos casos” (MCPHEE, et al., 2011).
O câncer de pâncreas está diretamente ligado a marcadores moleculares tais como mutações no KRAS,observados em cerca de 60 a 75% dos tumores. Além desses, outros genes supressores tumorais também são inativados, sendo eles: p16, p53 e SMAD4, sendo este último um associado a uma menor sobrevida em ressecções de adenocarcinomas de pâncreas. Ainda há a inativação do gene BRCA2 em 7 a 10% dos cânceres de pâncreas. A etiologia é desconhecida. Muitos casos de câncer pancreático são esporádicos. Acredita-se que o percentual de 16% dos cânceres sejam hereditários, ocorrendo em situações clinicas de síndromes familiares de acometimento sistêmico, doenças crônicas genéticas e cânceres pancreáticos com anormalidades gênicas não identificadas que correspondem a maior proporção de acometimentos (LONGO, 2013).
            Ao observar-se macroscopicamente, o câncer de pâncreas é caracterizado como um tumor infiltrativo firme que causa a obstruçãi do ducto pancreático, ocasionando uma inflamação da glândula distal. Em fases iniciais esses tumores tendem a obstruir o ducto biliar comum justificando o quadro de icterícia, em tumores volumosos, pode alargar a curvatura característica da cabeça do pâncreas (em “C”), evidenciados em exames de imagem. Os tumores da cauda e do corpo do pâncreas tendem a ser detectados tardiamente, e, portanto, tendem a ser mais volumosos neste estágio. O câncer cursa com a fibrose do tecido pancreático (reação desmosplásica), Os carcinomas do pâncreas são usualmente massas duras, estreladas, branco-acinzentadas, pouco definidas (MCPHEE, et al., 2011), como evidencia a imagem a seguir:


Ao exame microscópico, cerca de 90% dos tumores pancreáticos são adenocarcinomas, este tende a fazer metástase (por vias linfáticas e hematogênicas) para tecidos e órgão adjacentes, ocasionando também dores intensas, e podendo atingir regiões mais distantes, como mostra a figura a seguir:

Em corte histológico: “as glândulas malignas são atípicas, irregulares, pequenas e bizarras e geralmente são revestidas por células epiteliais cubóides e colunares anaplasticas, tumores bem diferenciados são a exceção”, como demonstra a figura a seguir:


A pancreatite crônica pode favorecer o desenvolvimento do câncer pancreático a medida que cronifica o processo inflamatório, formando o estroma. Os mediadores inflamatórios produzidos estão presentes nos ductos e no estroma com fibrose e é provável que promovam a formação do câncer, embora não se conheça o mecanismo de formação. Este crescimento maligno das células resulta do desequilíbrio de fatores de crescimento e aos receptores em que se ligam, contudo, não se tem esclarecido como tais alterações se relacionam com a etiopatogenia (MCPHEE, et al., 2011).

MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS 

Os sintomas iniciais incluem desconforto abdominal inespecífico, náuseas, vômitos, dificuldades no sono, anorexia e mal-estar generalizado. Apesar da percepção histórica de que uma massa na cabeça do pâncreas se apresenta com icterícia indolor, os achados inicias mais comuns são dor epigástrica, icterícia obstrutiva e perda de peso. Embora esses sintomas desencadeiem uma investigação imediata do pâncreas e da árvore biliar, eles ocorrem tardiamente na doença e estão geralmente associados a tumor avançados no momento do diagnóstico. O achado de vesícula biliar palpável, distendida, indolor, como resultados de obstrução da porção distal do ducto biliar comum por um tumor pancreático, é chamado de sinal de Courvoisier.Os pacientes podem apresentar trombose venosa superficial ou profunda (GOLDMAN, et al. 2009).
 As alterações laboratórios mais comuns incluem anemia e elevação das concentrações séricas de fosfatase alcalina, bilirrubina e aminotransferase. Aproximadamente 80% dos pacientes têm icterícia relacionada com obstrução biliar. Diabetes ou hiperglicemia são vistos como até 80% dos pacientes, e o câncer pancreático deve ser considerado no diagnóstico diferencial da causa de diabetes de início recente em pacientes com mais de 40 anos de idade e que não têm um histórico familiar de diabetes (GOLDMAN, et al. 2009).
Os tumores de outros tipos histológicos com origem no pâncreas podem também vir acompanhados de sintomas inespecíficos. Os pacientes com tumores funcionais das ilhotas inicialmente podem se apresentar com sintomas relacionados com a superprodução de peptídeos nas ilhotas. Os tumores císticos geralmente permanecem assintomáticos até se tornarem volumosos, momento em que são observados massa palpável, dor abdominal, náuseas, vômitos e perda de peso. A obstrução do ducto biliar comum é menos frequente do que nos adenocarcinomas ductais. Os tumores intraductais papiliféros mucinosos podem causar sintomas de pancreatite aguda ou de insuficiência pancreático devido à obstrução do ductopancreático (GOLDMAN, et al. 2009).

DIAGNÓSTICO

            Como diagnóstico precoce a ultrassonografia se mostra como uma ferramenta promissora, contudo, esta triagem também está direcionada a esforços pré clínicos que identifiquem marcadores biológicos que detectem o câncer pancreático precocemente. A triagem precoce atualmente se baseia na seleção de indivíduos em “grupo de risco” determinado incluindo as seguintes características: familiares com 3 ou mais parentes em primeiro grau com câncer de pâncreas, síndrome de Peutz-Jeghers ou pancreatite hereditária. (LONGO, 2013).
            Na avaliação dos pacientes sob suspeita de câncer do pâncreas, a ultrassonografia endoscópica, a TC helicoidal contrastada com multidetectores lineares e a RM mostram-se muito conclusivos na detecção dos tumores e no seu estadiamento. Em resultados inconclusivos para os exames anteriores descritos, recomenda-se a cateterização retrógrada endoscópica do ducto pancreático (PCRE). “Com a técnica moderna de imageamento da tomografia por emissão de pósitrons (PET), observa-se aumento da captação do marcador radioativo 2-[18F]-fl uoro-2-desoxi-D-glicose em cerca de 95% dos pacientes com câncer de pâncreasCaptações desse nível não ocorrem nos pacientes com pancreatite crônica”.  A biopsia de aspiração percutânea com agulha fina é realizada confirmação diagnóstica, principalmente nos pacientes com câncer do corpo ou da cauda do pâncreas e na investigação dos casos suspeitos de metástase. A TC helicoidal e a ultrassonografia endoscópica são realizadas em muitos casos no período pré-operatório para delinear a anatomia vascular local e investigar invasões vasculares que evidenciam a inoperabilidade (MCPHEE, et al., 2011).

TRATAMENTO

A cura do câncer de pâncreas é muito difícil, justamente devido à descoberta tardia, portanto, as medidas de tratamento paliativas são as mais utilizadas. As cirurgias para retirada dos tumores são mais indicadas nos estágios iniciais, na qual há a possibilidade de retirada total sem comprometimento muito grande do órgão ou tecidos adjacentes. A técnica cirúrgica mais utilizada é a Whipple ou Gastroduodenopancreatectomia, que consiste na remoção da cabeça do pâncreas, parte do copo, ducto biliar comum, vesícula biliar, parte do estomago e duodeno. Em casos de tumores mais agressivos, que afetem regiões mais delicadas para o acesso cirúrgico, ou em casos de metástases, é indicado o uso de quimioterapia ou radioterapia e, por vezes, até a combinação de ambas, dependendo da indicação médica levando em conta o estágio em que se encontra o câncer e o estado de saúde do paciente (SOLDAN, 2017). 

REFERÊNCIAS

GOLDMAN L., AUSIELLO D. Cecil: Medicina. 23ª ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. Vol I e II.

LONGO, Dan L. et al. Medicina Interna de Harrison. 18. ed. Porto Alegre, RS: AMGH Ed., 2013. 2 v.

MCPHEE, S. J.; WILLIAM, F. G.  Fisiopatologia da doença: uma introdução à Medicina Clínica . 5. ed. Porto Alegre : AMGH, 2011.

MOORE, Keith L.  Anatomia orientada para a clínica. 7. ed.  Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2014.

SOLDAN, MÔNICA. Rastreamento do câncer de pâncreas. Rev. Col. Bras. Cir.,  Rio de Janeiro ,  v. 44, n. 2, p. 109-111,  Apr.  2017

segunda-feira, 21 de maio de 2018

[CC II: #8] CARCINOMA DA VESÍCULA BILIAR


DEFINIÇÃO 


O Carcinoma da vesícula é a patologia maligna mais comum na árvore biliar,representando 80%-95% do cancro da árvore biliar no mundo sendo ainda o terceiro a sexto cancro gastrointestinal mais comum. A progressão da doença é frequentemente rápida e silenciosa tendo um desfavorável prognóstico. Aproximadamente 98% dos carcinomas da vesícula são de origem epitelial, e destes cerca de 90% são adenocarcinomas.Os subtipos histológicos de adenocarcinoma incluem as variantes papilar, mucinosa, intestinal, células claras e células em anel de sinete. Outros tipos mais raros de tumor (não epiteliais) podem surgir sendo tumores carcinoides, linfomas,sarcomas ou metástases.Com base nos aspectos macroscópicos, os tumores podem ser classificados como infiltrativos, nodulares, papilares ou mistos sendo os tumores infiltrativos os mais comuns.Os tumores nodulares são caracterizados por precoce invasão do fígado e órgãos adjacentes. Os papilares são predominantemente intraluminais, resultando em lesões polipoides. São menos invasivos e estão geralmente associados a melhor prognóstico.A disseminação tumoral pode ocorrer por invasão direta ou então via vascular, linfática,perineural, intraductal ou intraperitoneal. A distribuição do desenvolvimento de cancro na vesícula biliar é de aproximadamente 60% no fundo, 30% no corpo e 10% no colo.






HISTOPATOLOGIA / ETIOPATOLOGIA
Tido como raro, o carcinoma de vesícula biliar (CVB) constitui o tumor mais comum da árvore biliar e o quinto mais frequente do trato gastrointestinal. A maior incidência desta neoplasia maligna de vesícula ocorre em pessoas com idade acima de 65 anos. Acomete as mulheres em uma proporção significativamente maior, de aproximadamente 3:1 em relação aos homens de mesma faixa etária. Associado ao elevado percentual de incidência dos cálculos biliares em populações do México e Chile, tais países apresentam elevada mortalidade decorrente dessa neoplasia maligna comparado a países da Europa, no quais há uma incidência caracteristicamente menor.


         Os fatores predisponentes ao risco de surgimento de um carcinoma de vesícula biliar (CVB) variam muito em decorrência de condições que muitas vezes surgem em função diferenças ambientais, alimentação, hábitos e condições de vida do indivíduo, além de é claro, predisposição genética. Tais fatores estão listados no quadro 2:


A relação entre cálculos da vesícula biliar e carcinoma se relaciona ao trauma crônico e inflamação da camada mucosa da vesícula pela presença do cálculo que induz a displasia epitelial que pode predispor ao carcinoma. Evidencias experimentais têm sido observadas neste sentido e o risco relativo de carcinoma está elevado quando os sintomas e sinas de colecistite se apresentam precocemente. Histologicamente, a colecistite está usualmente presente em associação com carcinoma e quando a Colecistite crônica leva a calcificação da vesícula, o risco de malignidade está muito aumentado. O risco de câncer na “vesícula em porcelana” é muito elevado (20%) dos casos e justifica a colecistectomia profilática.




Infelizmente, as dificuldades no tratamento e a alta taxa de mortalidade associada ao CVB, consiste no fato de que na maioria das vezes o paciente apresenta características clínicas inespecíficas e sintomas ausentes na fase inicial do câncer, fazendo com que esta seja raramente é descoberto em um estágio em que a ressecção é possível, condicionando a um prognóstico reservado. A taxa de sobrevida de cinco anos consiste em apenas 5% dos casos. Além disso, cerca de 85% dos pacientes morrem um ano após terem sido diagnosticados. Não raro, ao serem descobertos muitos cânceres da vesícula biliar já invadiram o fígado ou se expandiram para os ductos biliares ou para os linfonodos hepáticos.




Os cânceres da vesícula biliar podem exibir dois padrões de crescimento: exofítico ou infiltrante. O padrão infiltrante é mais comum e usualmente aparece como área pouco definida de espessamento e endurecimento difusos da parede vesicular que pode cobrir vários centímetros quadrados ou comprometer toda a vesícula. Esses tumores são cirróticos e têm consistência muito firme. O padrão exofítico cresce para dentro da luz como massa irregular em couve-flor, mas ao mesmo tempo invade a parede subjacente.






Mais de 90% dos casos são representados por um padrão histológico de adenocarcinoma, que podem ser caracterizados em papilar, tubular, mucinoso. O carcinoma anaplásico, o escamoso e o adenoescamoso são os tipos menos comuns.


                                                        Adenocarcinoma papilar



Carcinoma adenoescamoso


SINTOMAS:


Os sintomas constitucionais, a ascite e a massa palpável são indicativos de doença avançada e pobre prognóstico. Os sintomas podem ter duração variável, de dois meses a três anos,dependendo do local e da extensão da lesão (tumor de crescimento intraluminal ou infiltrante). Pelo menos 20%dos pacientes são diagnosticados com câncer no momento da colecistectomia para colelitíase, ou mesmo no exame histopatológico pós-operatório da peça.Ao físico exame, podem ser detectadas icterícia, por invasão do colédoco, compressão de linfonodos pericoledocianos ou invasão hepática, massa assimétrica palpável e indolor em hipocôndrio direito (sinal de Curvoisier), em 40% dos casos, e ascite, bem como linfadenopatia peri umbilical(nódulo da Irmã Maria José), adenopatia supraclavicular esquerda (nódulo de Virchow) e massa palpável ao toque retal (“prateleira de Blumer”).
Outros sintomas menos comuns do câncer da vesícula biliar incluem obstrução ou fístula duodenal, sangramento gastrintestinal, hematobilia, devido à invasão do intestino ou dos vasos adjacentes.18,19 Pode, ainda, haver perfuração para o peritônio livre em até 5% dos casos


Deve ser levada em consideração, na anamnese, a presença de risco de fatores, como relacionados no Quadro:

A utilização de exames de imagem é mandatória e habitualmente a primeira abordagem é feita por ecografia abdominal, servindo como despiste de doença, uma vez que é um exame pouco específico. A ecoendoscopia é um exame completo. A sua utilização permite o estadiamento mais preciso e oferece a possibilidade de se realizar uma biópsia por agulha fina da lesãoA Tomografia Computadorizada ajuda a localizar a extensão da lesão permitindo um melhor e mais preciso estadiamento da doença assim como a pesquisa de invasão ganglionar ou metastização. É realizado como exame pré-operatório para definir a ressecabilidade dos carcinomas com maior acuidade.A utilização de ressonância magnética standard tem pouco valor. Para a detecção de invasão dos ductos biliares e da vascularização utiliza-se colangio ressonância uma vez que a sensibilidade e especificidade deste exame está muito próxima dos 100%.A tomografia computadorizada com emissão de pósitrons é utilizada para diferenciar lesões benignas de malignas e para detectar a presença de doença após cirurgia



DIAGNÓSTICO 

O diagnóstico do carcinoma de vesícula continua a ser um dos maiores desafios dos profissionais de saúde, uma vez que os sinais e sintomas são geralmente escassos e inespecíficos levando a um diagnóstico já em estágios avançados da doença. A maioria dos sinais e sintomas habituais são sobreponíveis a patologias benignas,principalmente litíase vesicular.A pesquisa de um meio complementar de diagnóstico que permita uma detecção precoce das lesões é frequentemente objeto de estudo e mote para realização de trabalhos de investigação.A nível de exames laboratoriais, estudos mais recentes defendem a hipótese da utilização da combinação de marcadores tumorais para detecção de carcinoma vesicular,apresentando algum avanço para uma abordagem mais precoce a esta patologia.CA19-9, CEA e CA125 são tradicionalmente usados como marcadores tumorais no carcinoma da vesícula. Geralmente, o nível de CA19-9 no sangue é muito baixo em pacientes com lesões benignas da vesícula; o CEA é utilizado majoritariamente em doentes com cancro colorretal; níveis de CA125 superiores a 11U/mL têm uma sensibilidade de64% e uma especificidade de 90% na diferenciação entre benignidade e malignidade de lesões da vesícula.Valores elevados de CEA e CA19-9 estão normalmente associados a tumores malignos.Valores elevados de CA19-9 combinados com CEA e/ou CA125 podem indicar um elevado risco de desenvolvimento de carcinoma da vesícula.De acordo com as guidelines da American Joint CommitteeonCancer(AJCC) e tem por base ainvasão e extensão do tumor (Tabela 1).Tabela 1 – Estadiamento TNM da AJCC resseção do leito hepático (margem de 2cm) ou dos segmentos IVb e V deve ser o método utilizado7,15.A colecistectomia é o tratamento de eleição para tumores que não ultrapassam a lâmina própria (Tis ou T1a)6,7. Nestes casos a taxa de sobrevivência é muito perto de 100%.

Abordagem mais segura nestes casos cursa com a realização da colecistectomia elinfadenectomia em bloco do hilo hepático e dos gânglios pancreáticos superiores.Marcadamente em termos de taxa de sobrevivência estimada a 5 anos verificando-se naordem dos 20% a 70% no casos de colecistectomia quando comparado aos 60% a 100%após cirurgia radical 6,7. Uma vez mais a abordagem cirúrgica é discutível mas está descrito que a ser realizada a abordagem deverá ser igual a de um tumor T1b.Como quimioterapia e radioterapia.A radioterapia, seja neo adjuvante, adjuvante ou paliativa, não está claramente comprovada, embora seja descrita e aplicada por alguns autores. Esquemas promissores incluem 5-fluorouracilo, gencitabina, capecitabina e cisplatinum. Se a quimioterapia for administrada ao doente deve ser colocada uma prótese biliar.



TRATAMENTO

    Estadiamento
O estadiamento do carcinoma da vesícula determina as opções de tratamento, é feito de



(Tabela 1):




O tratamento depende essencialmente do estadio e da forma de apresentação do tumor.

  •   O estadio TNM é diretamente proporcional à disseminação linfática e peritoneal.A única vertente de tratamento com potencial curativo é a resseção cirúrgica completa.Apesar da sobrevida a longo prazo não ser satisfatória, a taxa de mortalidade pós-operatória é inferior a 5%.
  •   Em doentes com tumores previamente diagnosticados deve ser realizada uma abordagem por laparotomia uma vez que na abordagem por laparoscopia a insuflação de dióxido de carbono, a lesão peritoneal e outros fatores podem favorecer a disseminação tumoral, nomeadamente implantes na parede abdominal e metástases nas portas de laparoscopia.
  •   Quando a doença se encontra limitada à vesícula biliar (T1), a colecistectomia como nos casos de tumores com invasão da camada muscular (T1b) a cirurgia tem sido alvo de grande debate e discussão por parte dos profissionais uma vez que há metastização em cerca de 20% dos casos, com taxas de recorrência na ordem dos 30% a 60%6
  •   No caso de tumores do com invasão da camada subserosa (T2), o prognóstico varia
  •   Em tumores com classificação superior ou igual a T3 o tratamento deve ser paliativo uma vez que a cirurgia seria demasiado agressiva para o benefício que daria ao doente e sem possibilidade de potencial curativo . Nestes casos a taxa de sobrevivência é de 2 a 4 meses e a sobrevivência a um ano é inferior a 5%. Paliativamente pode ser feita uma drenagem biliar cirúrgica ou não cirúrgica assim como medicação para controlo da dor 7.
  •   Em tumores de classificação igual ou superior a T2 pode ser utilizada terapia adjuvante.

REFERÊNCIAS
TORRES,O.JORGE MARTINS; Câncer da vesícula biliar. Proaci/semcad, 2010. Acesso em: 18 mai. 2018.

FERNANDES, José; ALVES, José. Carcinoma da vesícula biliar: Revisão bibliográfica. Faculdade de medicina da universidade do Porto: março, 2015