sexta-feira, 31 de março de 2017

[CC #5]: ESÔFAGO DE BARRETT



O esôfago de Barrett é uma enfermidade caracterizada pela substituição do epitélio estratificado pavimentoso do esôfago por epitélio colunar especializado do tipo intestinal. Tal quadro é recorrente em pacientes com refluxo gastroesofágico, apresentando longa duração. Ele é proveniente de uma resposta adaptativa da mucosa à agressão pelo ácido gástrico que reflui. Entre os fatores de risco para o desenvolvimento do esôfago de barrett estão a hérnia de hiato, ineficiência do esfíncter inferior do esôfago e o refluxo do conteúdo duodenogástrico. E este, o EB, representa um risco iminente para o câncer, sendo que, aproximadamente, 10% dos pacientes portadores desenvolvem adenocarcinoma no terço inferior do esôfago.

O esôfago de Barrett pode ser identificado em exame endoscópico pela presença de mucosa glandular acima da junção esofagogástrica. Sendo classificado como EB curto quando o epitélio fica nos 3cm distais do esôfago tubular e EB clássico, quando a mucosa glandular se estende por mais de 3 cm. O quadro da doença consiste na presença dos seguintes epitélios: o epitélio gástrico fúndico com células parietais e principais, o epitélio gástrico juncional da cárdia com glândulas secretoras de muco e o epitélio colunar especializado com metaplasia intestinal, sendo a presença de epitélio colunar especializado com células caliciformes, caracterizado morfologicamente como metaplasia intestinal um consenso atual para o diagnóstico histológico. Há vários tipos de células colunares que compõem a metaplasia intestinal, dentre elas, as células gástricas, células típicas do intestino delgado e cólon. O epitélio colunar de Barrett caracteriza-se pela presença da borda em escova e células caliciformes, associado à expressão gênica intestinal.

A proliferação celular no EB apresenta índices aumentados quando correlacionada com taxa de proliferação de epitélio colunar de sítio não metaplásico, estando este evento associado a um processo de desregulação do ciclo de divisão celular. A metaplasia é a substituição de células adultas, características de um determinado órgão, por outro tipo celular, mais resistente que o anterior. O refluxo gastroenteroesofágico, ácido ou biliopancreático, sintomático ou não, causa dano por processo inflamatório crônico, lesando o epitélio intestinal que acaba por ser reparado, ao longo dos anos. A metaplasia é uma condição pré-maligna, resultante de alterações genéticas, podendo haver o desenvolvimento de adenocarcinoma. Nos casos em que o esôfago terminal apresenta revestimento com epitélio colunar, mas não preenche os critérios para metaplasia intestinal tipo Barrett, não pode ser mais classificado como EB, recebendo a denominação de esôfago revestido por epitélio colunar.



 
O quadro clínico tem manifestações semelhantes às apresentadas pelos pacientes com DRGE e síndromes dispépticas. Contudo, em geral, o tempo de queixa encontra-se ampliado e, quando a duração dos sintomas é superior a 5 anos e há associação com queixas noturnas de pirose e regurgitação, a prevalência desta entidade é maior. Salienta-se que pode apresentar-se assintomática, podendo corresponder apenas a um achado endoscópico. Entretanto pode ser associada a manifestações extra-esofágicas, tais como as pulmonares e otorrinolaringológicas.

O procedimento de escolha para o diagnóstico é a endoscopia digestiva alta, podendo ser confirmada a metaplasia por meio de biópsia. Recomenda-se que pacientes com sintomas de DRGE por mais de 5 anos sejam submetidos ao procedimento, especialmente se tiverem 50 anos ou mais. Pode ser encontrada displasia, que é apontada como a etapa anterior ao aparecimento de neoplasia em nível macroscópico. A nível histológico, trata-se de neoplasia intra-epitelial, com atipias celulares restritas ao epitélio, sem invadir a membrana basal.

A displasia pode ser classificada em baixo grau, alto grau e indefinido para displasia, a partir dos atributos propostos por Montgomery: maturação epitelial, arquitetura das glândulas, características citológicas e presença de inflamação. Na mucosa normal, as glândulas se apresentam redondas ou ovais e sem ramificações, encontrando-se em meio a um estroma de tecido conjuntivo frouxo. É considerada alteração arquitetural o aglomeramento de glândulas, presença de ramificações e/ou mudanças nos seus tamanhos e formas. Para analisar a maturação epitelial, compara-se as células das porções profundas da mucosa com as células da superfície. Considera-se alteração a presença de núcleos maiores na superfície. Podem ser encontradas ainda atipias citológicas relacionadas ao volume, cor e relação núcleo/citoplasma, e sinais de inflamação. 



 
O tratamento farmacológico para esôfago de Barrett é o mesmo aplicado para DRGE, com o emprego de inibidores da bomba de prótons. Há pouca evidência, no entanto, de que este tratamento evite o surgimento de adenocarcinoma ou leve à regressão do quadro. O paciente deve evitar em sua dieta o consumo de alimentos fritos e gordurosos, chocolate, menta, álcool, café, bebidas gaseificadas, frutas cítricas, tomate e derivados, mostarda, vinagre, aspirina e demais anti-inflamatórios não esteroidais. Tais alimentos aumentam a secreção ácida do estômago, o que pode agravar o quadro. Como ocorre o refluxo das secreções pancreática e biliar junto ao suco gástrico, o tratamento farmacológico pode ser ineficaz, por atuar apenas sobre o componente ácido do refluxo. Nesses casos, a cirurgia é indicada, tendo maior eficácia na regressão dos fatores associados a câncer do que o tratamento farmacológico.

A ocorrência do distúrbio é mais frequente entre os 55 e 65 anos, acometendo duas vezes mais homens que mulheres, sendo que homens brancos constituem 80% dos portadores da doença. São fatores de risco o tabagismo, consumo de álcool, obesidade e uso de bifosfonatos orais (utilizados para o tratamento de osteoporose). A prevalência varia entre 0.9% e 10% da população adulta. Apenas 0.5% dos pacientes com esôfago de Barrett desenvolve adenocarcinoma no esôfago, porém esse número vem crescendo.

O nome do distúrbio foi dado em homenagem ao cirurgião torácico inglês Numan R. Barrett (1903-1979), que em 1950 descreveu no artigo Úlcera péptica crônica e esofagite uma condição distinta da esofagite relacionada ao refluxo, mas a atribuiu a uma extensão do estômago para dentro do mediastino. Allison, outro cirurgião torácico, e Johnstone, um radiologista, publicaram em 1953 outro artigo, em que descrevem como úlceras de Barrett as regiões em que foi percebida metaplasia intestinal, e o próprio Barrett, em 1957, publicou mais um artigo, em que concorda com a conclusão a que chegaram Allison e Johnstone em 1953.

Referências

http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1676-24442004000300009
http://emedicine.medscape.com/article/171002-overview

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